Urubu do amor... |
Andei pelas ruas achincalhando seu nome.
Contei seus segredos, como quem conversa na feira. Beijei
bocas fétidas de palavras podres. Mas seus beiços-cigarro-café, jamais.
Contei a todos os seus defeitos. Sem efeitos, inventava mais
alguns.
Joguei em suas costas o peso das pedras e urubus que o
vento colocava em meu caminho. O mesmo vento que soprava a nosso favor.
Maldisse seus gostos e costumes. Seu jeito roceiro de
viver na cidade, a simplicidade do vestir e falar. Amaldiçoei as cervejas divididas,
os risos, as contas que não paguei, as histórias repetidas.
Os malditos garçons da praça Roosevelt sabiam de nós. Sabiam
e nada disseram. Não me contaram do cliente de longa data. Dos olhos lascivos,
das bundas passantes e penetradas.
Seus tiques de retardado. Insensibilidade, a falta de
flor. Um homem que chora. Mas sem sangue e coração. O gozo crescido, o suspiro
de menino.
Em comum acordo, jurei a deus e ao diabo, não mais te
ver, nem deixar entrar seja por qual porta fosse.
De armadura e trabuco, cheguei. Espremi a campainha que
nunca funcionou. Nada de mais, meus livros que esqueci. Já li, mas foram caros.
Sorriso sem dente. Olá e tudo bem, como manda o figurino.
Calor. Geladeira cheia. Educação. Cerveja de intenções.
Sofá pequeno. Umas palavras soltas, um olhar preciso.
Um dia.
Dois dias.
Três dias.
Domingo. Pernas xadrez bordam o lençol. Conchas de gente
dentro. Abraço e leite com canela.
Não se vive o que se fala. Floresce o que se sente.
Angelina Miranda é jornalista e escritora sem livros.
Ri alto, é fã de jabuticaba, cachorro, botecos e maus modos.
Dá uns pitacos pelo Feici e faz uns versos no Poesias Angelinas.
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